quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Paracoccidioidomicose e Histoplasmose

Doenças Infecciosas - Paracoccidioidomicose e Histoplasmose

Paracoccidioidomicose Oral


     A paracoccidioidomicose (ou Blastomicose Sul-americana) é uma doença fúngica de maior prevalência nas Américas central e do Sul, e é causada principalmente pelo microrganismo Paracoccidioides brasiliensis. A doença é considerada como uma infecção fúngica profunda, assim como a histoplasmose e a blastomicose, acometendo primariamente (na maiorias dos casos) os pulmões devido a inalação do agente infeccioso. A doença foi descrita pela primeira vez por Adolf Lutz, no brasil, em 1908.
       O Paracoccidioide brasiliensis é um fungo dimórfico encontrado em áreas úmidas. Os agricultores e moradores dos campos são os mais afetados. A doença é bastante prevalente nos homens, chegando a proporção de 15:1 em alguns estudos. Acredita-se que os hormônios femininos tenham a capacidade de inibir a transformação das hifas do fungo para a forma de levedura (forma que causa a doença), isso explica tamanha prevalência de acometimento nos pacientes de gênero masculino.
     O Brasil, México, Colômbia e a Argentina apresentam muitos casos da doença e pacientes que apresentam a Paracoccidioidomicose em outras regiões, normalmente relatam ter visitado essas áreas endêmicas.

Características Clínicas 

     A paracoccidioidomicose é uma doença que primariamente acomete o trato respiratório, e partir de então, caso haja alterações no sistema imunológico do indivíduo, se dissemina para outras áreas através dos vasos sanguíneos e  linfáticos. A pele e os linfonodos  são os locais mais infectados secundariamente.
    Em indivíduos imunocompetentes e jovens o curso da doença normalmente é agudo, mimetizando uma gripe comum, incluindo sintomas como febre, tosse e perda de peso. Pacientes que apresentam comprometimento do sistema imunológico podem desenvolver um curso crônico, semelhante ao que ocorre na tuberculose (hemoptise e sudorese noturna) ou um curso disseminado, sendo a condição mais grave. A Paracoccidioidomicose disseminada é mais comum em pacientes com AIDS ou de idade avançada e é caracterizada pelo acometimento extrapulmonar.
     A cavidade oral na maioria dos casos é acometida de forma secundária, sendo o palato e a gengiva os locais mais acometidos. As lesões são ulceradas e apresentam um aspecto granular (multiplos pontos hemorrágicos) que na literatura é descrita como aspecto moriforme (ou "mulberry-like" em inglês), por lembrar o aspecto de frutas vermelhas. Essas lesões geralmente são multifocais e apresentam sintomatologia dolorosa. O envolvimento do palato pode provocar perfuração e consequentemente, causar uma comunicação buconasal. Infecções primárias em cavidade oral são bastante incomuns, e quando ocorrem, tentem a acometer áreas com comprometimento da defesa, como áreas de extração recente e grandes ulcerações.
     A região facial, principalmente a região bucal e nasal, são locais de envolvimento comum da pele pela doença. As lesões costumam ser ulceradas e crostosas, com potencial bastante destrutivo. Assim como nas mucosas, as lesões cutâneas costumam apresentar pontos hemorrágicos.
  Ulceras orais provocadas por outras doenças infecciosas profundas como a tuberculose, histoplasmose, blastomicose e sífilis primária devem ser incluídas no diagnóstico diferencial. A diferenciação com o Carcinoma de células escamosas também deve ser realizada, principalmente quando o local de acometimento da paracoccidioidomicose é a borda lateral de língua ou o assoalho bucal.



Lesões ulceradas com aspecto de "frutas vermelhas" em palato duro
Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0738081X12000363




Paracoccidioidomicose - Lesão cutânea destrutiva em região de mucosa e asa do nariz
Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0738081X12000363


Características Histopatológicas

     A microscopia das lesões orais provenientes das infecções fúngicas profundas são inespecíficas, apresentando áreas granulomatosas, onde é observado infiltrado inflamátório contendo principalmente  macrófagos e células gigantes multinucleadas. Na paracoccidioidomicose, o epitélio de superfície normalmente apresenta-se hiperplásico (hiperplasia pseudoepiteliomatosa) e "parece" tentar invadir o tecido conjuntivo adjacente, essa condição deve ser bem avaliada para que o patologista não chegue a um diagnóstico errôneo, pois muitas vezes a imagem histológica pode ser semelhante a um Carcinoma de células escamosas.
     A diferenciação entre as lesões fúngicas profundas deve ser feita a partir da identificação do microrganismo. Essas técnicas podem ser facilitadas com o auxílio de corantes específicos como o Grocott-Gomori (coloração por metenamina de prata) e o PAS (Ácido periodico de Schiff). As leveduras do Paracoccidioides brasiliensis apresentam o aspecto característico de "orelha de Mickey" e "roda de leme" devido aos brotamentos dos microrganismos.
   Em relação ao diagnóstico diferencial microscópico, outras infecções granulomatosas como a histoplasmose, tuberculose e leishmaniose devem ser levadas em consideração. Além disso, a literatura ainda inclui a sarcoidose e a doença de Crohn.


Reação granulomatosa contendo múltiplos macrófagos e células gigantes 
multinucleadas, observar a presença do microrganismo no interior
dessas células.
Disponível em: https://patologia.iptsp.ufg.br/n/4945-paracoccidioidomicose

Histoplasma Capsulatum - Aspecto de "orelha de mickey"
Disponível em: http://anatpat.unicamp.br/nptparacoco3b.html


Brotamento em "roda de leme"
Disponível em: http://www.microbiologybook.org/mycology/mycology-6.htm


Diagnóstico e Tratamento  

   O diagnóstico da Paracoccidioidomicose deve ser confirmado por meio da identificação do agente causal nos espécimes de biópsia ou citologia esfoliativa (padrão ouro na doença). Exames radiográficos para avaliação pulmonar são bem indicado, pois como já abordado, a grande maioria dos casos da doença em boca, consiste de infecções secundárias, onde o foco primário é o trato respiratório, Exames sorológicos para identificação de anticorpos também são indicados e apresentam resultados positivos em grande parte dos casos.
   O tratamento dessa condição deve ser realizado a partir da administração de antifúngicos como o itraconazol, fluconazol, cetoconazol e anfotericina B (mais utilizada em ambiente hospitalar, devido a sua alta toxicidade). Em casos mais brandos, a literatura mostra que as sulfonamidas (associadas ou não a antifúngicos) apresentam bons resultados.

Histoplasmose Oral

     A histoplasmose é uma doença fúngica profunda causada pelo microrganismo Histoplasma Capsulatum, um fungo dimórfico que em sua forma de levedura é patogênico. Esse fungo pode ser encontrado em áreas úmidas e em fezes de pássaros e morcegos, por isso, essa doença é mais prevalente em indivíduos que habitam as zonas rurais. O Brasil e outros países da America são considerados áreas endêmicas da histoplasmose. Normalmente, o paciente adquire a doença a partir da inalação do microorganismo.

Características Clínicas

         Grande parte dos casos de histoplasmose são assintomáticos, não havendo prejuízo para a qualidade de vida do paciente. Assim como a doença abordada acima, a Histoplasmose, clinicamente, pode ser dividida em aguda, crônica e disseminada. Alguns estudos mostram que o curso da doença é influenciado por três fatores - Sistema imunológico do paciente, quantidade de fungos inalados e a cepa de de Histoplasma capsulatum.
      A Histoplasmose aguda é a forma mais comum (que apresenta sintomatologia), onde os pacientes relatam sintomas mais brandos, geralmente fadiga, febre e tosse não produtiva, essa forma é mais comum em pacientes jovens, que apresentam um bom sistema imunológico. A Histoplasmose Crônica assemelha-se a tuberculose e é mais comum indivíduos imunossuprimidos e idosos. Em alguns países essa doença está muito relacionada com a AIDS, com cerca de  2% a 10% dos pacientes com essa condição. Outras formas de diminuição da capacidade de defesa do organismo podem estar relacionadas com deficiência nutricional, doenças renais crônicas, transplantes e uso prolongado de corticosteroides.
     A forma disseminada da doença é a mais importante para a Estomatologia, pois, a cavidade oral pode ser acometida por meio de infecção secundária (o pulmão geralmente é o local da infecção inicial).
      As lesões em cavidade oral são caracterizadas por ulcerações normalmente unitárias e de bordas endurecidas que acomete a mucosa jugal, palato duro e língua em grande parte dos casos. Os pacientes costumam relatar sintomatologia dolorosa e que percebeu a lesão a bastante tempo. A orofaringe também é um importante sítio de infecção secundária, principalmente em pacientes imunossuprimidos.   
     O diagnóstico diferencial da histoplasmose em cavidade oral é realizado a partir de outras doenças infeciosas e principalmente com lesões malignas como o Carcinoma de células escamosas (algumas lesões podem ser idênticas).


Histoplasmose - Lesões ulceradas em palato mole
Disponível em: http://www.sgim.org/web-only/clinical-images/oral-ulcers-with-weight-loss


Lesão ulcerada em borda lateral de língua, o local e o aspecto sugerem
uma condição maligna.
Neville et al, 2009


Ulceração de bordas endurecida mimetizando um carcinoma de células
escamosas.
Disponível em:http://medind.nic.in/jay/t09/i3/jayt09i3p157.htm


Histoplasmose em gengiva
Disponível em:http://www.emedicinehealth.com/histoplasmosis/page4_em.htm


Características Histopatológicas

     Histologicamente, a histoplasmose é caracterizada por granulomas, que são formados principalmente por macrófagos e células gigantes multinucleadas. A identificação do Histoplasma capsulatum pode ser realizada em HE, embora seja difícil localizar o microrganismo nessa coloração. O uso do PAS ou da coloração de Grocott-Gomori são mais indicadas. Outras lesões granulomatosas devem ser incluídas no diagnóstico diferencial histopatológico da histoplasmose.

Reação inflamatória contendo múltiplas células fagocitárias.
Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0365-05962013000300420&script=sci_arttext&tlng=pt


Observar microrganismos fagocitados por macrófago 
Disponível em: http://anatpat.unicamp.br/npthistoplasmose1b.html

Leveduras de Histoplasma Capsulatum em coloração por metenamina de prata
(Grocott-Gomori)
Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0365-05962013000300420&script=sci_arttext&tlng=pt



Diagnóstico e Tratamento

     Assim como outras lesões fúngicas profundas, o diagnóstico da histoplasmose é obtido a partir da identificação do fungo. Exames sorológicos e de imagem (radiografia pulmonar) podem ser solicitados para facilitar o processo diagnóstico.
    O tratamento dos casos mais brandos da doença (forma aguda) é realizado com base na sintomatologia, sendo um tratamento paliativo, pois a histoplasmose aguda tende a ser autolimitada. Os casos crônicos e principalmente os disseminados, necessitam de tratamentos mais fortes, com a utilização de antifúngicos. O uso de anfotericina B intravenosa ou longos períodos de administração de itraconazol são recomendados nos casos de histoplamose disseminada.


Referências

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ANTONELLO, Vicente Sperb et al. Oropharyngeal histoplasmosis: report of eleven cases and review of the literature. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, v. 44, n. 1, p. 26-29, 2011.


DE CARVALHOSA, Artur Aburad et al. Paracoccidioidomycosis prevalence in a public laboratory of the Brazilian unified health system. 2012.


MARQUES, Silvio Alencar et al . Histoplasmose cutanea reveladora de infeccao pelo HIV. An. Bras. Dermatol.,  Rio de Janeiro ,  v. 88, n. 3, p. 420-423, June  2013.


MARQUES, Sílvio Alencar. Paracoccidioidomycosis. Clinics in dermatology, v. 30, n. 6, p. 610-615, 2012.


MOHAMMED, Shafiulla et al. Oral histoplasmosis masquerading as oral cancer in HIV-infected patient: A case report. Medical mycology case reports, v. 1, n. 1, p. 85-87, 2012.


NEVILLE, B.W.; DAMM, D.D.; ALLEN, C.M.; BOUQUOT, J.E. Patologia Oral e Maxilofacial. Trad.3a Ed., Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, 972p.

REGEZI, J.A; SCIUBA, J.J; JORDAN R.C.K. Patologia Oral: Correlações Clinicopatológicas. 6ª edição. Elsevier, 2013.


WOO, S. B. Atlas de patologia oral. 1. ed. - Rio de Janeiro : Elsevier, 2013.







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